No ambiente escolar mesmo
havendo o discurso da necessidade de abraçar a diversidade e de quebrar paradigmas
(o rótulo, combatendo o bulling, o sexismo) também não está isento de
interferências de conceitos próprios, pré-conceitos particulares explícitos ou
não, tanto dos professores como da própria instituição em si, tendo em conta
que o próprio calendário de datas comemorativas escolares é tendencioso e não
representa toda a nossa sociedade. A escola é uma instituição socializadora e
de representatividade social, onde muitas questões enraizadas de cunho ético,
moral, cultural e religioso são colocadas em cheque, também é um espaço de
confrontos de ideias e princípios, do enfrentamento de questões externas que
transpõem o seu interior.
No que diz respeito à
inclusão de pessoas com deficiência a nossa sociedade está a passos lentos
tentando compreendê-las e inseri-las em diversos âmbitos, tentativa essa que se
configurou apenas após o enfrentamento de muitas lutas no que tange a concessão
de direitos e da garantia do pleno exercício da cidadania por parte dessas
pessoas. O que não significa que já se tenha concretizado, que a luta acabou ou
que é somente de um pequeno grupo.
Em se tratando dos professores se pensarmos
que assim como cada aluno eles também se constituem sujeitos históricos
representantes de toda uma sociedade que ainda tem raízes no preconceito fica
fácil compreender, uma postura talvez desajeitada, no enfrentamento do novo e ao
lidar com questões que fogem a sua plena compreensão ou que confrontem o seu
conhecimento prévio. Por esse motivo talvez, muito também decorrente das suas
próprias vivências, das suas emoções externadas no campo da experiência com o
diferente, é que apareçam termos inadequados ao referir-se a alunos com
necessidades educacionais especiais ou até mesmo a tentativa de enquadrá-los em
um perfil estigmatizado desrespeitando a singularidade de cada um. Como, por
exemplo, o pensamento colocado pela autora Lígia Amaral no texto “Sobre
Crocodilos e Avestruzes” ao dizer que: “se uma atividade é boa para essa pessoa
com deficiência também será boa para todas as pessoas nessas condições”. Ou até
mesmo o julgamento depreciativo no sentido de subestimar a capacidade de um
aluno, por alguma condição diferente, também é observável no ambiente escolar.
A autora Lígia Amaral também
coloca como um empecilho o
“desconhecimento
concreto e vivencial desse algo ou alguém assim como as nossas próprias reações
diante deles”. Assim penso na necessidade de se quebrar esse muro limitador que
impede a aproximação das pessoas, pensando na escola como um local de
socialização, quem sabe a complexidade da relação professor aluno, nesse
aspecto, seja exatamente o despertar da consciência da suas próprias
limitações, por parte dos professores. No caso quando nos defrontamos com um
sujeito que nos assinala a nossa própria deficiência, talvez essa barreira seja
uma auto defesa, pois é difícil para o professor assumir a postura de que ele é
quem não sabe como lidar com determinada situação, inclusive essa posição de
negação da própria inabilidade pode ser devido ao peso que carrega sozinho de
que deva ter essa competência.
Trazendo essa reflexão a
minha prática certamente já experimentei essa sensação de inaptidão, já tive
alunos que me fizeram parar e mudar de atitude, ter de buscar alternativas como
ir atrás de cursos específicos ou chamar a família para conversar, para desse
modo conseguir compreendê-lo melhor. Na prática considero que o mais relevante
seja se colocar disposto a abandonar conceitos, estar disponível a aprender
também, buscar a aproximação com os alunos estando consciente de que também tem
limitações a vencer.
Pensando assim é notório que todos têm
limitações, todos somos diferentes e essa conscientização deve ser propagada,
até mesmo por que não podemos esquecer que muitos em nossa história já sofreram
(mulheres acusadas de bruxas e deficientes foram queimados, além da escravidão
negreira, entre outros) e muitos ainda sofrem ao se depararem sozinhos com a
sua diferença, colhendo a injúria e a indiferença por parte de uma maioria sem
consciência, quantas infâncias foram e ainda serão arrebatadas pelo algoz do
preconceito. Podemos aprofundar essa reflexão com a seguinte citação de Amaral:
“(...) a presença de preconceitos e a
decorrente discriminação vivida, ainda com mais intensidade, pelos
significativamente diferentes, impedindo-os muitas vezes, de vivenciar não só
seus direitos de cidadãos, mas de vivenciar plenamente sua própria infância.”
Concluindo, o preconceito é
cruel e deve ser combatido, mas acredito que a melhor maneira de enfrentá-lo
seja conhecendo-o de perto, a sua expressão que é por vezes subliminar, quem
sabe buscando entender que todos têm limitações que podem ser transponíveis,
talvez seja o primeiro passo. Já que é possível que o preconceito encontre suas
raízes em cada um de nós também, mesmo naqueles que afirmam piamente em não
tê-lo, pois somos todos submetidos à massificação generalizada introduzida
pêlos meios midiáticos, são modelos de comportamento, padrões de beleza e
concepções que também influenciam em nossas atitudes. Resumindo, o preconceito
e o conseqüente ato discriminatório são um mal que devem ser erradicados no
âmago da nossa sociedade, erradicados de nossas cidades, de nossos bairros, da
nossa rua, das escolas, de nossos lares, dentro da convivência com nossos
familiares e do interior de nós mesmos.
Referências:
AMARAL, Lígia Assumpção. Sobre crocodilos e avestruzes: falando de diferenças físicas,
preconceitos e sua superação. In: AQUINO, Júlio Groppa. Diferenças
e preconceito na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo:
Summus, 1998. p. 11-30.
Links: https://youtu.be/RN7WMDSdQKI
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